domingo, 27 de julho de 2008

Corais diabólicos

Será preciso ouvir mais umas vinte vezes para conseguir processar essa sexta sinfonia do Glenn Branca, batizada de "Devil Choirs at the gates of Heaven", mas já arrisco alguns comentários:

1) Que foda! (dãr...)
2) As guitarras distorcidas criam diversas camadas sonoras, como se fossem músicas paralelas, enquanto no "núcleo" da peça linhas melódicas delicadas e quase imperceptíveis são desenhadas. Tentar encontrá-las em meio ao caos sonoro é como procurar o Wally. Como na famosa porém um tanto esquecida série de livros, a busca pelo personagem/melodia descortina toda uma nova gama de imagens/sons.
3) Enquanto ouvia a peça, uma veia do lado esquerdo da minha cabeça começou a pulsar. Até hoje, nunca tinha percebido a existência dessa veia...

Torrent aqui.

sábado, 26 de julho de 2008

Yes, SYR


Está marcado para 2ªfeira, dia 28 de julho (também conhecido como depois de amanhã), o lançamento de Andre Sider af Sonic Youth. Este é o oitavo disco da série SYR, e consiste em 60 minutos de improvisação ao vivo gravada no festival de Roskilde, na Dinamarca, com a participação do saxofonista sueco Mats Gustafsson e do artista sonoro japonês Masami Akita (aka Merzbow).
Bancada pela gravadora independente da banda (chamada Sonic Youth Records), essa série mostra o lado ainda mais experimental, barulhento e vanguardista de Thurston Moore e Cia.
Lembra do vídeo do primeiro post? É uma faixa multimídia de SYR 4: Goodbye 20th Century, disco no qual o grupo interpreta peças de alguns dos nomes mais importantes da música de vanguarda do século 20. E ainda tem gente que acha que o Sonic Youth é aquela bandinha indie que toca "Sugar Kane"...

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Guitarras + orquestra + vanguarda

Desculpe a umbiguice, mas esse post começa com uma historinha pessoal.

Quando terminei o colegial, com 18 anos, resolvi me dedicar integralmente à música. Fui estudar no Conservatório Souza Lima (onde fiquei por 3 anos) e lá participei de um projeto chamado Orquestra de Guitarras Souza Lima, que é uma... êr... orquestra de guitarras. Funciona assim: um professor maluco e querido chamado Ciro Visconti (que também é guitarrista do Diáfanes) juntou um monte de guitarristas e botou os caras pra tocar música clássica. Mas não no estilo Malmsteen, que transforma obras-primas em pura merda egocêntrica. Não. Fazíamos bonitinho: éramos divididos em naipes como se fôssemos uma orquestra de cordas (havia o 1º e o 2º "violinos" - eu era do 2° - a "viola" e o "violoncelo", que era uma guitarra com uma afinação toda diferente e mais grave) e seguíamos à risca a partitura. Nada de bends, improvisos, solos.

Bom, não éramos lá essas coisas, mas como a idéia era original, as pessoas gostavam de nos ver tocar. O Ciro dizia que éramos a primeira e única orquestra de guitarras do mundo. Ele até brincava: "Somos a melhor orquestra de guitarras do mundo. Mas, se surgir alguma outra, corremos o risco de nos tornarmos a PIOR do mundo. Então, estudem".

Mas o grande Ciro estava errado. Um cara chamado Glenn Branca já havia criado algo parecido quase vinte anos antes e, para nosso azar, muuuito melhor. Sediado em Nova York, o Glenn Branca Ensemble executa peças compostas pelo próprio Branca, todas com forte caráter de vanguarda. A mais recente delas se chama Hallucination City Symphony for 100 guitars. Isso mesmo, CEM GUITARRAS.

Eles vem tocando pelo mundo, mas é difícil o Brasil entrar na rota de qualquer coisa ligada à música erudita contemporânea. E, como essa peça também não foi registrada em disco ainda, o jeito é assistir alguns trechos pelo Youtube, todos com áudio péssimo.



Mas nem tudo é desgraça: as peças mais antigas (a Hallucination é a 13ª) foram registradas em disco, que já estão sendo devidamente baixados pelo torrent. Mais posts do Branca em breve.

ps1: caso alguém se pergunte por que eu estou falando sobre um cara que faz música erudita (ainda que com guitarras) sendo que prometi ficar apenas no popular, há uma explicação: Glenn Branca também foi uma figura importante da no wave e integrante da banda Theoretical Girls.

ps2: sabe quem já fez parte do Glenn Branca Ensemble? Thurston Moore e Lee Ranaldo.

ps3: a quem interessar possa:


A terceira pessoa da esquerda pra direita sou eu. Quatro anos atrás...

sábado, 19 de julho de 2008

James Chance and the Contortions


No ano seguinte à participação na coletânea No New York, o James Chance and the Contortions lançou seu primeiro álbum, intitulado Buy. Nele, a equação punk + free jazz ganha mais um elemento: o funk, resultando em um som simultaneamente ruidoso e dançante.

Além da mistureba maluca de estilos, outra coisa interessante da banda é a qualidade técnica dos integrantes. Apesar de não serem virtuoses (ainda bem!), todos sabem exatamente o que querem de seus instrumentos. Enquanto o sax de James Chance e as guitarras de Jody Harris e Pat Place soam ensandecidas (mas nunca fora do tempo ou tocadas de qualquer jeito), o baixo de David Hofstra e a bateria de Don Christensen sustentam o groove. A única coisa que faz uma certa falta é o órgão de Adele Bertei, que saiu do grupo após No New York. Em Buy, o instrumento aparece algumas vezes, mas de maneira mais tímida e executado pelo próprio James Chance.

O disco começa com “Design to Kill”, de pegada bem funk. Segue com “My infatuation”, que tem o sax mais dissonante da História (exageros meus à parte...) e com “I don’t want to be happy”, que lembra bastante o som do Devo, banda geralmente encaixada na categoria new wave – é, aquela mesma que a no wave supostamente era a antítese... Rótulos são pra refrigerante, não tem jeito.

A quarta faixa se chama “Anesthetic” e tem um clima charmoso de bar-esfumaçado-dos-anos-50, época em que o jazz era a música dos excluídos, dos beatniks, dos drogados, e não essa coisa de engomadinho que é hoje. A mesma atmosfera reaparece em “Twice Removed”, embora esta tenha mais guitarras distorcidas e gritos punks.

As demais músicas de Buy são puro groove. E como funk é para dançar e não para ficar analisando, o post acaba aqui.

Para baixar o bonitinho, clique aqui.
Link surrupiado do blog http://sonoraaurora.blogspot.com/

Fui.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Com a palavra, Lester Bangs

Nesse link, um texto do Lester Bangs sobre a no wave:

http://www.notbored.org/bangs.html

É bem legal, ele cita vários nomes da cena e explica a ligação com o free jazz e com a música do Velvet Underground. Esse texto saiu no Psychotic Reactions and Carburetan Dung, catatau de mais de 400 páginas que, no Brasil, foi lançado com o nome de Reações Psicóticas e é um livro de bolso de cento e poucas páginas. Vergonha...

segunda-feira, 7 de julho de 2008

No New York



Cara, foi um parto baixar esse disco. Até aprendi a fazer download pelo torrent pra conseguir – e no fim vi que é bem fácil usar esse treco... Mas enfim, falemos do que realmente importa.

No fim dos anos 70, logo após o estouro do punk, algumas bandas resolveram levar o espírito destruidor (no bom sentido) do movimento um passo além: apesar das letras contestadoras, dos berros e das cuspidas na cara de fãs, em termos estritamente musicais o punk não trazia grandes inovações. Pelo contrário: o que a maioria dos grupos propôs foi uma volta ao rock básico, então soterrado pelas toneladas de virtuosismo do progressivo. Tudo continuava em 4 por 4, tonal e com o velho esquema tônica- subdominante-tônica. Mas aí apareceram na cidade de Nova York bandas que, em vez de tocar três acordes na guitarra, preferiam socar o instrumento. Em oposição ao pop da new wave (também um desdobramento do punk), o novo estilo musical foi batizado de no wave.

Os shows das bandas de no wave duravam dez, quinze minutos, e eram uma explosão de ruídos. Foi nessas apresentações que um cara chamado Thurston conheceu um outro chamado Lee e uma garota chamada Kim. Os três resolveram montar uma banda e o resto da história todo mundo já sabe. Outra figura a se interessar pelo novo som foi o já conhecido Brian Eno – sim, antes de se tornar produtor do (glup) Coldplay, ele era um cara legal que tocou no Roxy Music, lançou discos fodaços como Here Come the Warm Jets e Taking Tiger Mountain, e percebeu a importância do que estava acontecendo em Nova York.

Em 1978, Eno resolveu organizar uma coletânea com os principais nomes da cena. Os escolhidos foram James Chance & The Contortions, Teenage Jesus and the Jerks, Mars e DNA. Cada um deles participou com quatro faixas, e assim nasceu No New York, o disco que foi um parto baixar.



James Chance & The Contortions (creditada apenas como Contortions) é a primeira banda, e abre a compilação com “Dish It Out”. A música começa com o baixo fazendo uma linha simplíssima enquanto um saxofone cospe desordenadamente zilhões de notas, quase nenhuma delas afinada e muitas delas em frequências agudíssimas. O uso do sax remete ao free jazz, estilo que (e)levou o jazz ao caos sonoro e que também foi fonte de inspiração pro povo da no wave. Depois de mais de um minuto de sopros insanos, entra um órgão e James Chance (que também é quem toca o sax) começa a cantar, quer dizer, a berrar. Apesar do clima aparentemente caótico, a música segue a forma tradicional estrofes – refrão.

Na faixa seguinte, “Flip Your Face”, o refrão é abolido e as guitarras ganham mais projeção. Como em “Dish it Out”, o baixo executa uma linha bem definida e constante, com notas afinadas, e sobre essa base vem a barulheira, desta vez extraída das seis cordas (esse esquema, aliás, lembra bastante o do trio Thurston-Lee-Kim, não? Referências são tudo nessa vida). Em “Jaded”, é a vez do órgão ganhar mais espaço, martelando acordes dissonantes que, somados ao andamento lento e às incursões ruidosas das guitarras e do sax, formam o fundo instrumental para a letra sobre amor obsessivo. “I Can´t Stand Myself”, última faixa do The Contortions é um cover, ou melhor, “cover” de James Brown e segue o mesmo modelão “baixo segurando a onda (e nesse caso, fazendo um groove) enquanto a casa cai”.



O próximo da lista é o Teenage Jesus and the Jerks, da lendária vocalista/guitarrista Lydia Lunch. Ela foi uma figura importantíssima da no wave a até teve uns rolos amorosos com o James Chance, mas sua banda estava muito atrás do Contortions. Além de menos experimental, o Teenage Jesus é tosco – coisa que o baixo da primeira faixa, “Burning Rubber”, já deixa bem evidente. As letras e a interpretação angustiada de Lydia Lunch são o trunfo da banda. Quando, em “The Closet”, ela expressa o horror de viver na classe média americana com um “I’m treated like Sharon Tate”, o arrepio na espinha é inevitável.


A terceira banda, Mars, chega mandando “Helen Forsdale”, música que segue o estilo Contortions de baixo normal e guitarra pirada – e que pirações legais... Letras quase ininteligíveis são uma característica da no wave, mas nessa música isso é levado ao extremo. Parece que o cara está cantando em alguma língua morta de uma tribo perdida da Groenlândia, mas, por incrível que pareça, “Helen Forsdale” é em inglês e até tem letra dela no encarte do disco (demorou pra baixar, mas veio completo!). Tentei umas três vezes acompanhar e juro que não dá para encaixar nenhuma palavra. Sério, NENHUMA. Punk à décima potência, baby.


Em “Hairwaves”, o vocal continua um emaranhado de grunhidos, mas é a música como um todo o que mais chama a atenção: não tem ritmo, melodia, harmonia ou tonalidade – pelo menos não identificáveis para os ouvidos de um ser humano normal. Toda cheia de buracos, quebras e silêncios, “Hairwaves” parece flutuar no nada. Linda. “Tunnel” também é pura entropia, só que dessa vez, furiosa. Já “Puerto Rican Ghost”, que dura apenas um minuto, é uma música de urgência (“mommy close the door/ mommy close the door/ puerto rican ghost/ puerto rican ghost”) e talvez também uma crítica ao medo de “chicanos”, tão comum na terra do tio Sam (ou talvez eu apenas esteja viajando na maionese).


O último nome da compilação é o D.N.A., banda que tinha Arto Lindsay na guitarra e que não possuía baixo. A primeira música (“Egomaniac’s Kiss”) e a última (“Size”) não fazem muito sentido dentro da coletânea por trazerem pouco radicalismo sonoro. São, digamos assim, punk rock convencional (no caso de “Egomaniac’s Kiss”, com uns toques de blues). Na instrumental “Lionel”, a coisa começa a melhorar, ou seja, a ficar mais barulhenta. “Not Moving”, a terceira faixa, é o ápice, com uma guitarra enlouquecida que, mais ou menos no meio da música, começa a emitir uns sons que parecem passarinhos psicóticos. E quando o vocalista repete “Not Moving, not moving”, ele fica em apenas uma nota, dando a sensação de que a própria música também não sai do lugar. Chico Buarque pós-punk.

E assim acaba No New York, o disco que foi um parto baixar, mas que não será mais, pois eu, legal que sou, comprimi o bichinho em .rar e botei no RapidShare:
http://rapidshare.com/files/127969866/VA_-_No_New_York__ogg_.rar.html

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Modo: Iniciar

Barulho transformado em música. Deixo minha esquizofrenia sonora de lado e me concentro nesse único assunto. No qual, aliás, não sou nenhuma especialista - longe disso. Com ouvidos quase-virgens vou penetrando o universo da no wave, do noise, da eletrônica experimental e de todas as músicas que não cabem em partituras. Minhas descobertas, compartilho aqui.

O nome do blog é uma homenagem ao Sonic Youth - banda que, junto ao Velvet Underground, me introduziu na música barulhenta:

Piano #13 (George Maciunas)


ps.: apesar desse primeiro vídeo cabeça, não tratarei aqui da música erudita contemporânea. Seria preciso muito conhecimento, coragem e arrogância para me meter a falar de Stockhausen, Cage, Pierre Henry.