segunda-feira, 20 de junho de 2011

Como não brincar de música erudita

Meses atrás, escrevi um post sobre as ótimas gravações que o Naked City fez de algumas peças do repertório erudito. Hoje, vou falar um pouco sobre como o trio de jazz The Bad Plus assassinou Fém, estudo para piano de Gyorgy Ligeti.

Para começo de conversa, eu gosto muito do The Bad Plus, tanto que fui ao show que eles fizeram aqui no mês passado e entrevistei os caras (talvez esteja na próxima edição da +Soma). Uma das coisas que eu aprecio na banda é o fato dela regravar Nirvana, David Bowie, Radiohead, Black Sabbath e várias outras bandas/artistas de rock e pop. Outra coisa que aprecio muito é o fato dessas regravações serem extremamente respeitosas com as originais. Por mais que eles mudem o ritmo, a harmonia, virem a música do avesso, a essência da música é preservada - para comprovar, basta ouvir a versão deles para Lithium.

Infelizmente, o mesmo respeito não é devido às peças do repertório erudito. No disco For All I Care (no qual está a ótima versão de Lithium, aliás), eles gravaram Fém, Semi-Simple Variations (Milton Babbit) e Variation d'Apollon (Stravinski). Decidir trabalhar com esse repertório já traz um problema: enquanto na música pop há uma melodia e uma harmonia e sobre essa base se constrói o arranjo, na música erudita a composição já é seu próprio arranjo - portanto, não há muita margem para variações.

Uma das poucas coisas abertas à variação é o timbre - e foi exatamente isso o que o Naked City fez, ao trocar piano por guitarra e contrabaixo, por exemplo. Já The Bad Plus resolveu mexer na própria estrutura da música: enfiaram bateria onde não tinha e nem era pra ter, e, no caso do estudo do Ligeti, cortaram a segunda parte da peça. Perguntei isso a eles e o pianista respondeu que ele achava que esse coda não estava certo, então resolveu consertar (sim, "fix it" foi a exata expressão que ele usou) para o Ligeti.

#FAIL

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