terça-feira, 16 de abril de 2013

O som ao redor


Tão bom quanto assistir ao show de um artista ímpar é poder conhecer um tiquinho o modus operandi desse artista - e, no último fim de semana, tive a oportunidade de fazer as duas coisas graças à apresentação de Phil Minton (ao lado da incrível Audrey Chen) e à oficina Feral Choir que ele ministrou no CCSP. De quebra, ainda tive a honra (ou a falta de noção...) de botar minha voz de arara fanha para soar na sala Adoniran Barbosa, já que Minton convidou os participantes da oficina de sexta para darem uma palhinha no show do sábado.

Bom, quando entrevistei Minton e Han Bennink no finzinho de 2010, o que mais me impressionou foi ver como aqueles dois senhores quase septuagenários se comportavam como moleques descobrindo o mundo. Tudo despertava o interesse deles: uma mulher bonita passando, um maluco dando trocentas voltas correndo no Trianon, a feirinha do MASP, os sons. Principalmente os sons. Tanto que, no parque, Phil Minton já entabulou uma conversa com os passarinhos por meio de assobios.

A paixão pelos sons ficou ainda mais evidente na oficina na sexta-feira. De olhos fechados, ele comandava o coral e se divertia com os sons produzidos pelo gogó dos participantes. E quando digo se divertir, quero dizer que ele sorria, ria e tinha no rosto aquela expressão de quem diz "não gostaria de estar em nenhum outro lugar agora".


Além da simpatia e da generosidade, é preciso dizer que ele tem um ouvido do caralho. Conseguia saber o que cada um estava fazendo, e quando sacava que, no meio da cacofonia, havia duas ou três pessoas  fazendo algo que se encaixava, ia delicadamente mandando todos pararem de cantar e só esse pequeno grupo continuar - e era aí que os incautos participante finalmente se davam conta da pequena pepita sonora perdida no monte de grunhidos.

Minton também está sempre atento aos sons involuntários: o barulho de um cano de água, a sirene de um carro de polícia (que numa dessas coincidências bizarras soava exatamente como o barulho que estávamos produzindo com a voz no momento) e uma nota que estava soando pela construção. Essa nota, aliás, foi escolhida por Minton para ser o tom do drone que ficamos segurando enquanto ele cantou lindamente com melodia e letra - pena não ter feito isso no sábado, foi a parte da oficina que mais me emocionou....


E isso tudo me ajudou a compreender o tipo de experiência musical que ele oferece ao público dos shows. Apesar de não ser facilmente digerível, sua música não é hermética. Não é preciso conhecer profundamente a música contemporânea nem ler um tratado filosófico de 600 páginas para entender o que ele e Audrey Chen faziam no palco. Aliás, arrisco dizer que nem há o que entender: basta manter a mente e os ouvidos abertos e apreciar duas pessoas explorando suas vozes. Explorando os sons.

Talvez por isso eu nunca tenha presenciado um show de improvisação livre que começou com a plateia cheia e, raridade das raridades, terminou com a plateia cheia.


ps: agradeço ao Cauê Ueda por ter cedido as fotos lindonas que ilustram esse post.



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