quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Joguinho das semelhanças

Eis que o blog (bem legal, por sinal) Música Para Seus Ouvidos lançou um pacote de resenhas de discos pesadões de 2010 e logo o primeiro texto é sobre o mais recente do Swans - e é sempre legal quando as pessoas lembram do Swans. Mas enquanto eu lia o texto, também comecei a me lembrar de algo: da resenha que eu fiz desse disco em agosto de 2010 pro Rraurl. Acontece que o texto do MPSO está estranhamente parecido com o meu. Aqui vão alguns trechinhos que não me deixam mentir (os do MPSO estão em azul e os do meu, em vermelho):

Antes do lançamento do novo álbum do Swans, o vocalista e líder Michael Gira fez questão de frisar que isto não significaria apenas uma reunião. Como tudo o que faz na vida, Gira, de cara feia, foi logo afiando a sua língua maldita: “não é um ato de nostalgia imbecil!”.

Após um hiato de 13 anos, a banda Swans voltou à ativa no começo de 2010 e agora está lançando um disco novo, My Father Will Guide Me Up a Rope to the Sky. [...]... o vocalista/guitarrista Michael Gira deixou bem claro no site da gravadora Young God Records que "ISSO NÃO É UMA REUNIÃO. Não é um ato de nostalgia imbecil. Não é repetir o passado. Após cinco álbuns do Angels of Light (banda que Gira formou depois do fim do Swans), eu senti necessidade de seguir EM FRENTE, em uma nova direção, e reavivar a idéia do Swans está me permitindo fazer isso".

Para quem não sabe, o Swans é daquelas bandas espetaculares que surgiu no começo da década de 1980, junto com Sonic Youth e afins, e ficou eternamente no submundo adorado por pessoas do submundo. Em seus primeiros anos de sons extremamente pesados e sombrios, com características mais ligadas ao metal, o grupo foi amaciando e modernizando a sua música, mas sem nunca sair do underground. As coisas ficaram mais bem trabalhadas, o que não significa que ficaram alegres e sorridentes.

O Swans foi formado na Nova York em 1982 e fez parte da segunda geração da no wave, mesma cena em que nasceu o Sonic Youth. Nesse primeiro momento, a música da banda era bem pesada (resvalando no metal), arrastada e repetitiva. A temática das letras girava em torno de morte, violência, crueldade. Imagine um disco do Slayer em rotação lenta: é mais ou menos isso. Em 1986, com a entrada da vocalista/tecladista Jarboe, o som do grupo começou a passar por um lento processo de mudança: o andamento deixou de ser tão lento, a repetição ad nauseum de uma mesma célula musical deu lugar a estruturas mais convencionais (baseadas em estrofes e refrões), o vocal ficou mais melodioso e as guitarras barulhentas abriram espaço para instrumentos acústicos. A agressividade do período inicial foi abrandada, sem que a banda se tornasse comercial ou perdesse seu caráter sombrio.

O bom de ver álbuns recentes de pessoas competentes e com pensamentos desnorteados de caos total é perceber a qualidade tecnológica aliada a sons realmente impactantes. My Father… é, acima de tudo, um álbum muito bem encaminhado e executado, desde as nuances de 9 minutos da faixa de abertura “No Words/No Thoughts” até a delicadeza imponente de “Little Mouth”. O que vale perceber é a mudança de espírito em cada faixa, que sai do mais puro silêncio inocente para tensões de graves repetitivos, algo muito claro na música “You Fucking People Make Me Sick”, que possui até participações leves de Devendra Banhart e da filha de 3 anos de Gira, para logo mais ser cortado por uma sinfonia assustadora.

O disco abre com "No words/no thoughts", uma pedrada de 9 minutos e meio em que uma sucessão de sinos, guitarras distorcidas e ruídos fantasmagóricos maravilham e massacram o ouvinte. Essa faixa possui duas características marcantes e que acompanham o álbum como um todo. A primeira delas é o uso da dinâmica. Em uma época de arquivos digitais em que o som é compactado e comprimido, é interessante ver uma banda trabalhar com diversas intensidades em uma mesma música. A passagem da serenidade para o caos pode se dar de maneira gradual (em crescendos) ou abrupta (se o Swans original trabalhava com uma constância que chegava a ser agonizante, agora há sempre uma surpresa no caminho). Já a passagem do caos para a serenidade é sempre instantânea, levando a uma sensação de alívio imediato, mas que não dura muito tempo. [...] No quesito susto, destaca-se "You Fucking People Make Me Sick". Com participação especial do bicho-grilo Devendra Banhart e da filha de três anos de Gira nos vocais, a faixa começa com um clima meio hippie e inocente. Até que, sem nenhum aviso prévio, as vozes e violões simplesmente somem, dando lugar a um bumbo grave e a um piano literalmente socado. Trompetes e trombones dissonantes e assustadores completam o filme de terror sonoro que se desenrola por dois minutos.

Agora o que mais me impressionou nas semelhanças não foi nem que ambos falamos que no começo o som do Swans era mais agressivo e ligado ao metal e com o passar dos anos isso foi mudando sem que a banda perdesse o caráter sombrio, ou que uma das características marcantes do novo disco é a mudança abrupta de climas, ou ambos termos destacado que a faixa de abertura tem 9 minutos, ou mesmo usado a palavra "assustador" para falar da faixa You Fucking People Make Me Sick. O que me deixou mais impressionada é que esses trechos que selecionei aparecem exatamente na mesma ordem nos dois textos: sim, os dois começam com Gira dizendo que não é uma reunião, seguem para a origem e história da banda e aí entram na descrição de faixas do disco novo.

Sei não, mas me parece que rolou uma inspiração aí - ou então esse foi um caso bizarro que coincidência como quando eu e uma amiga do colegial sonhamos na mesma noite que estávamos em Alto Paraíso com nossos pais e uma cobra aparecia. Vou botar o link pra esse post nos comentários de lá. Esperemos a resposta do autor.

ps: não tô acusando ninguém de nada e mesmo que tenha rolado uma chupinhação cara-dura não vou fazer escândalo - até porque sou a favor do copyleft e tal. Mas sei lá, talvez um agradecimentozinho fosse gentil. Ou me pagar uma cerveja da próxima vez.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Fuck yeah Jarboe


Além de estar no rol das "mulheres fodonas da música", Jarboe faz parte do seleto grupo dos "seres pensantes do metal". E também é esquisitona e faz tantas caretas bizarras pra cantar que parece um cruzamento de Kate Bush com Charles Manson.

Ela começou a carreira pra valer quando entrou no Swans em 1985. No começo sua participação era mínima: um tecladinho bem escondido aqui, um backing vocal bem discreto ali - e antes disso ela passou um tempo como roadie da banda. Com o passar dos anos ela foi ganhando mais espaço no grupo de Michael Gira, mas nunca pode, digamos assim, mostrar seu potencial metaleiro. Nas músicas mais pauleiras ou ela não aparecia ou era coadjuvante, e só assumia o vocal nas menos agressivas, com mais teclado que guitarra - menos agressivas no quesito instrumental, porque as letras não tinham nada de meigas. Abaixo, um video do World of Skin, um projeto dela com o Gira:



Desde 1991, com o disco Thirteen Masks, ela iniciou uma carreira-solo paralela à banda - que se tornou seu projeto principal após o fim do grupo, em 1998. Ano passado, Michael Gira ressuscitou o Swans e lançou o ótimo My father will guide me up a rope to the sky, mas Jarboe ficou de fora. Vai saber...

Foi fora do Swans que Jarboe pode explorar o metal. Mas nada de guitarras em ritmo de galope e essas merdas. O metal de Jarboe é arrastado, denso, cheio de climas e com pitadas de espiritualidade oriental. Pra ser sincera, estou conhecendo o trabalho dela agora e por enquanto o que posso destacar é o disco Mahakali, de 2008, que traz as participações do ex-Pantera Phil Anselmo e de Atila Csihar, que além de cantar no Mayhem também faz uns shows e lançou um disco com o Sunn O))).

Jarboe | NYC @ Santo's Party House | 27 Jun 2009 | Kali V from (((unartig))) on Vimeo.


Mas a moça (ops, senhora) também dá umas escorregadas. Ano passado lançou um disco chamado Primal Barroque Experiment, que é um mix infeliz de pseudo-batucadas com teclados malas, tudo muito tedioso e com aparência de ter sido feito no laptop. Resumindo, o negócio é o seguinte: quando ela pende pro lado mais new age/world music (desculpe os palavrões), os resultados são decepcionantes, mas quando ela cai pro lado macabro/metal... fuck yeah Jarboe!!!

ps: queria embedar mais vídeos, mas não achei nenhum com áudio decente...

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Ah, lindos cisnes...

Taí um pessoal que poderia dar um pulinho no Brasil em 2011:

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Centésimo post


Comemorando a chegada do centésimo post do Destruindo Pianos, preparei uma playlist com 100 músicas que representam bem o espírito do blog: tem Velvet, Sonic Youth, no wave, Vanguarda Paulistana, coisas dos anos 90, barulhos e esquisitices em geral. Alguns dos artistas já apareceram em posts por aqui, outros aparecerão em breve. Só baixar e ser feliz!
(obs: os arquivos estão em vários formatos diferentes. Sugiro baixar o Reprodutor de mídias VLC, um software gratuito, livre, que toca qualquer coisa e não enguiça)

Pasta A – Novaiorquices, noventices e pós-punk

01 - 30 seconds over Tokyo – Pere Ubu
02 - Antiworld – Nina Hagen
03 - Braid 1 and Leaping song – Meredith Monk
04 - Ddiamondd – Battles
05 - Design to kill – James Chance and the Contortions
06 - Ecstasy – Lou Reed
07 - Eric’s trip – Sonic Youth
08 - Face place – The Slits
09 - Forgiveness – Yeasayer
10 - From her to eternity – Nick Cave & The Bad Seeds
11 - From the air – Laurie Anderson
12 - Gallons of rubbing alcohol flow through the strip – Nirvana
13 - Ghost rider – Suicide
14 - Harness your hopes – Pavement
15 - Here she comes now – The Velvet Underground
16 - In the flowers – Animal Collective
17 - Junkhead – Alice in Chains
18 - Kill yr. Idols – Sonic Youth
19 - Lesson No. 1 for electric guitar – Glenn Branca
20 - Lounge act – Nirvana
21 - New new – DNA
22 - Ono soul – Thourston Moore
23 - Rain on Tin – Sonic Youth
24 - Red dress – TV on the Radio
25 - Rock’n’roll nigger – Patti Smith
26 - Staircase – Beirut Slump
27 - Suck you dry – Mudhoney
28 - The wagon – Dinosaur Jr.
29 - Tonight tonight – Smashing Pumpkins
23 - Too much paranoias – Devo
31 - Under the house – PIL
32 - Useful chamber – Dirty Projectors
33 - Venus in furs – The Velvet Underground
34 - Violet – Hole
35 - Walk on the wild side – Lou Reed
36 - We die young – Alice in Chains
37 - While you wait for the others – Grizzly Bear

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Pasta B – Metal, industrial, kraut, eletrônico

38 - A hanging – Swans
39 - Akuma no kuma – Sunn O))) + Boris
40 - Boris – Melvins
41 - Born Stubborn – Sepultura
42 - Come do daddy – Aphex Twin
43 - Convincing people – Throbbing Gristle
44 - Country lane – Wendy Carlos
45 - Do the Mussolini (headkick) – Cabaret Voltaire
46 - Facelifter – Naked City
47 - Halber Mensch – Einstuerzende Neubauten
48 - Headhunter – Front 242
49 - Loneliness – Tuxedomoon
50 - Longue Route – The Young Gods
51 - Machine Gun – Portishead
52 - Masked ball – Jocelyn Pook
53 - Mushroom – Can
54 - Negativland – Neu!
55 - No words no thoughts – Swans
56 - One step beyond – Fantômas
57 - Short piece – Krieger
58 - Start the riot – Atari Teenage Riot
59 - The man machine – Kraftwerk
60 - The soul continues – Jarbor + Attila Csihar
61 - Urlo Negro – Mike Patton
62 - Warm leatherette – The Normal

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Pasta C – Freejaz, Radiohead, Beck, psicodelia, Vanguarda Paulistana, instrumental brazuca e outros

63 - All I need – Radiohead
64 - Anteontem – Itamar Assumpção
65 - Apaixonite aguda – Itamar Assumpção
66 - Astronomy Domine – Pink Floyd
67 - Che belew shellela – Getatchew Mekuria + The Ex
68 - Chemtrails – Beck
69 - China my China – Brian Eno
70 - Colors – Pharoah Sanders
71 - Dear darkness – PJ Harvey
72 - Diversões eletrônicas – Arrigo Barnabé
73 - Embalos – Itamar Assumpção
74 - Friction – Vandermark 5
75 - Gray sunset – Ariel Pink
76 - Harry Partch – Beck
77 - In limbo – Radiohead
78 - Indiu – Tetê Espíndola + Philippe Kadosch
79 - Kokend asfalt – Ex Orkest
80 - Leeds United – Amanda Palmer
81 - Lubenica – Emir Kusturica & The No Smoking Orchestra
82 - Machine Gun – Peter Broetzmann Octet
83 - Man-size sextet – PJ Harvey
84 - Only Shallow – My Bloody Valentine
85 - Paranoid Android – Radiohead
86 - Pentagramarama – Satanique Samba Trio
87 - Provolone – A Banda de Joseph Tourton
88 - Resh hex – Tobacco + Beck
89 - Santo Antonio – Hermeto Pascoal
90 - Sertão – Tetê Espíndola
91 - Sova – Hurtmoldt
92 - Sutil – Na Ozzetti
93 - Tô tenso – Patife Band
94 - Treci Vavilon – Darkwood Dub
95 - Trench – Jonny Greenwood
96 - Trio de efeitos – Grupo Rumo
97 - Vamos dar mais uma – Macaco Bong
98 - We travel the spaceways – Sun Ra
99 - White rabbit – Jefferson Airplane
100 - Who needs the peace corps – Frank Zappa

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Queria ter colocado alguma coisa de black metal também, mas não achei. Então fica esse vídeo de bonus track (as roupas são ridículas, a mensagem é uma merda e os caras não são pessoas que eu chamaria pruma cerveja, mas essa música é bem interessante, principalmente as mudanças bruscas de um clima pra outro):

Tchau 2010

Este ano foi bem parado aqui no blog, mas eu andei fazendo umas matérias/resenhas bem legais por aí (e já tem coisa prontinha pra sair em 2011 também). Aqui vão os links:

Reportagem sobre o disco Clara Crocodilo, que completou 30 anos em 2010 (essa matéria foi minha estreia na revista +Soma, que é tipo a revista dos sonhos de quem quer trabalhar com cultura e escrever sem amarras): http://www.maissoma.com/2010/8/20/ensaio-clara-crocodilo-por-raquel-setz

Entrevista com a Banda Isca de Polícia, falando sobre os discos de inéditas do Itamar e sobre os shows de lançamento: http://www.maissoma.com/2010/10/13/entrevista-isca-de-policia-fala-sobre-o-show-caixa-preta

Review do show insólito do duo Phil Minton (voz) e do Han Bennink (bateria): http://www.maissoma.com/2010/12/16/show-phil-minton-e-han-bennink-centro-cultural-vergueiro

Nesta edição da +Soma, tem uma entrevista que fiz com o Luiz Tatit e uma resenha da Caixa Preta, do Itamar. Baixe aqui.

No rraurl, resenhei os discos novos da Charlotte Gainsbourg (produzido pelo Beck), Holly Miranda, Mike Patton, Swans e, na seção tesouros, falei sobre o crássico No New York.

Por fim, uma matéria sobre o bizarro festival de viking metal que rolou no Manifesto Bar (e esta foi minha estreia no blog da Vice, outra revista dos sonhos): http://www.viceland.com/blogs/br/2010/07/29/por-odin-ce-ta-pensando-que-sou-loki/

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Ooooops

Na minha listinha de ontem, esqueci de uma importante:

5. I IN U, da Laurie Anderson, no CCBB


Eis que uma exposição com fotos, vídeos e muitas instalações sonoras da artista multimídia e ícone da vanguarda Laurie Anderson desembarcou em Sampa, no CCBB. Ocupando quatro andares do prédio e reunindo trabalhos de 1970 até os dias de hoje, I IN U tinha tudo para ser uma puta exposição de cair o queixo. O único problema é que 90% das obras sonoras estão inaudíveis. Sem isolamento acústico entre as instalações, o que se ouve é uma cacofonia dos infernos. Isso sem contar o barulho que vem da rua (como é no centrão e a porta fica aberta, joga uns 80 decibéis aí), da cafeteria e dos funcionários do lugar, que conversam alto e cantam (é, CANTAM) no meio das obras. No dia em que fui, ainda fui presenteada com dois grupos de crianças não muito educadas e uma professorinha que, ao ver as diversas obras cuja temática é o sono e os sonhos, soltou a seguinte pérola:
- Como essa Laurie gosta de dormir! Tô achando que ou ela é preguiçosa, ou tem anemia ou então está esperando o príncipe encantado vir dar um beijo.

Mas mesmo em meio ao caos foi possível apreciar algumas obras, como 'Night Life', em que sonhos bizarros são descritos em pequenos textos e ilustrados com lindos desenhos digitais, a instalação multimídia (vídeo, músicas e objetos) 'Delusion' com sua perturbadora história da cadela Loebelle, o caderno com instruções sobre como virar as páginas de um caderno, e a genial 'Handphone Table', em que os braços e mãos do público se tornam fones de ouvido - pena que, por estar no hall de entrada com toda a barulheira do centro e uma tv passando a gravação de uma performance de Anderson, não deu pra ouvir muita coisa.

A seguir, um videozinho sobre 'Delusion':

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Breve apanhado do último mês

Algumas coisas que vi/ouvi no tempo que passei sem postar:

1. Lançamento da Caixa Preta de Itamar Assumpção


Finalmente, o box contendo a discografia toda do mestre + dois álbuns de inéditas foi lançado e, pra marcar o acontecimento, rolaram vários shows no SESC Pompeia. Todos os discos foram apresentados quase na íntegra durante três fins de semana, com dois discos/shows por noite. A primeira noite, de 15 de outubro, foi com a clássica Banda Isca de Polícia fazendo o ainda mais clássico Beleléu Leléu Eu, e com os mineiros do Porcas Borboletas tocando Às Próprias Custas s.A. O show da Isca (entrevistei a banda pro site da +Soma, aqui) foi incrível e emocionante, com Suzana Salles e Vange Milliet quebrando tudo nos vocais e na performance. Zena, a viúva de Itamar, estava sentada em uma mesa da choperia, e enquanto a banda tocava Baby, lembrava dela me contando que essa música foi feita pra ela. Foi difícil segurar a lagriminha. E o pessoal do Porcas mandou bem recriando o disco mais difícil da carreira de Itamar.

No dia 16 de outubro, teve Anelis Assumpção fazendo Sampa Midnight, que talvez seja o meu favorito do Nego Dito, e Karina Buhr Intercontinental. Curti bastante os dois, e fiquei bem surpresa com a Karina. Tinha visto uma participação dela num show em homenagem ao Manguebeat e achei nada de mais. Mas a garota apavorou transformando Filho de Santa Maria em embolada, Sexto Sentido em rock pesadão e Zé Pelintra em ponto de terreiro (cantou acompanhada apenas de atabaques, que ela mesma tocou). As participações de Elke Maravilha, falando sobre a morte de um jeito leve e bonito ("O Itamar foi brincar de outra coisa, daqui a pouco eu vou também") e cantando uma música em alemão sobre a guerra foi foda. E Denise Assunção no meio da plateia cantando Parece que foi ontem parecia uma força da natureza. Lindo.

No dia 23 foi a vez das Orquídeas do Brasil apresentarem o primeiro volume da trilogia Bicho de 7 Cabeças. Não sou uma mega fã dessa fase do Itamar, mas reconheço o trabalho profundo de artesanato musical que há ali. O problema das Orquídeas, a meu ver, é o teclado, que além de ser desnecessário em uma banda com trocentas musicistas, tem um timbre horroroso. Mas o show foi bem bacana, principalmente pela participação de Alzira e Tetê Espíndola e pela inclusão da música Sei dos Caminhos, uma das melhores parcerias de Ita e Alice Ruiz e que, apesar de sempre tocada nos shows das Orquídeas, nunca foi gravada.

O show que veio em seguida, de Mariela Santiago, foi o que se pode chamar, sem injustiça, de DESASTRE. A cantora tem ótimos músicos na banda e a mistura de diversos gêneros da música negra é bem interessante, mas o que ela fez com as faixas do volume 2 da trilogia foi um crime. As faixas do disco devem ter, em média, 3 minutos. No show, cada música durou uns 10. No começo, ela embromava minutos a fio, depois repetia a letra umas 5 vezes e embromava mais um tanto no final. Metade da plateia estava vazia no fim do show e quem ficou até o fim saiu reclamando.

Sobre a Caixa Preta não vou falar agora, porque uma resenha minha sairá na próxima edição da +Soma. Boto o link aqui depois.

2. Festival de Jazz de Cascavel
Aí aconteceu uma coisa engraçada: fui ao Oeste paranaense ouvir música brasileira instrumental e, por conta da trilha sonora dos ônibus que vão de Cascavel para cidades vizinhas, acabei tendo um intensivão de sertanejo universitário, pagode de corno e dance music - e tenho que confessar que em alguns momentos essa parte inesperada foi mais divertida e agradável que a outra. O primeiro dia foi ótimo, com os catarinenses do Rio Vermelho fazendo um som com melodias cativantes e sem solos longos, e a super banda formada pelo pianista Nelson Ayres, o violonista Ulisses Rocha e o acordeonista Toninho Ferragutti. O terceiro dia foi bom, com o show de Marcell Powell, filho de Baden que toca pra cecete, tem uma boa escolha de repertório, mas às vezes enche o saco com subidas e descidas de escala nos looongos solos (aliás, achei o solo do baixista da banda o melhor da noite) e o chatinho Portinho Trio (saca piano bar? quase isso).

Mas queria mesmo falar do segundo dia, que foi insuportável. E escolho comentar mais sobre esse não porque eu goste de falar mal das coisas, mas porque ele abriu uma brecha pra eu dizer algumas coisas que estão entaladas na garganta há alguns anos. Vamos lá: o primeiro show, do pianista Gilson Peranzetta e do saxofonista/flautista Mauro Senise não me empolgou (clima piano bar, de novo), mas não ofendeu. O segundo show, do guitarrista Ricardo Silveira, é que foi dose.

Existe um dogma de que jazz é uma música de alto nível e, portanto, tudo o que recebe o rótulo jazz deve ser respeitado (ou melhor, venerado), e quem criticar é um ignorante. Mas, como os livros sagrados, bandas e artistas de jazz não só podem como devem ser criticados, se não quisermos nos tornar fundamentalistas musicais. O que se viu no palco do Cascavel Jazz Festival no show de Ricardo Silveira, foi o máximo da falta de originalidade e do egotismo: primeiro a banda toca um tema, aí o guitarrista fica três horas solando (dessas três, duas são subindo e descendo escalas de nomes estranhos - outro dogma jazzístico, aliás), volta o tema e tchau. Uma vez um professor muito querido mas também um tanto equivocado disse que "a música é pretexto para improvisar", o que equivale dizer que "a arte é pretexto para a exibição narcisística". É esse tipo de mentalidade que faz com que 90% das pessoas fuja da música instrumental - eu mesma não via a hora de buscar refúgio no som trash do busão cascavelense.

3. Planeta Terra


Sábado, dia em que completei 26 anos, rolou o Festival Planeta Terra, disparado o melhor e mais bem organizado do Brasil. Como já estou velha, resolvi ver poucas atrações. Comecei pelo Yeasayer, ótima banda do Brooklyn que fez um show delicioso. Vi o início do Passion Pit, mas a voz de gás hélio do vocalista me encheu o saco, então encontrei umas amigas e fui comer. Fugi do Phoenix, banda sem graça que misteriosamente lotooooooou a pista do palco principal, e voltei pro Pavement (agradecimentos eternos ao pessoal hype que foi ver Hot Chip e deixou a pista parecendo salão de baile). Show FODA: Stephen Malkmus em pose blasé enquanto os outros caras da banda piravam, super alegres de estarem ali. No set list, Stereo, Gold Soundz, Shady Lane e Cut Your Hair. Nessa, achei que a plateia fosse cantar o 'uh uh uh uh...' com mais vigor - mas também achei que veria montes de camisa de falnela e não vi, nada é perfeito nessa vida. Ah, e teve também Range Life, em que eles tiram um sarro do Smashing Pumpkins.

Já o show do Smashing Pumpkins foi polêmico: monte de gente descendo o cacete, mas eu achei bem bom. Ok, o solo de bateria foi ridículo, a guitarra tava desafinada em Today e a baixista estava lá de enfeite, mas justiça seja feita: a versão mais roqueira de Ava Adore foi animal, Tonight Tonight e Bullet with buterfly wings não tem como dar errado e as músicas novas não são geniais, mas estão longe da mediocridade. Então por que tanta implicância com Billy e sua turma? Tenho um palpite: a implicância vem do fato de Billy Corgan ser um mala e, pior do que isso, de sua atitude de rockstar de gênio difícil estar fora de moda. Enquanto o Pavement e as bandas pós-Strokes são formadas por caras comuns, desses com quem gostaríamos de tomar uma cerveja no boteco, Corgan não se livra da aura de estrela de multidões. Nos anos 90, quando isso ainda existia e o Pumpkins era uma puta banda, dava pra engolir o temperamento do moço. Hoje não dá mais.

4. Metal Machine Trio
Lou Reed desembarcou em Sampa pra fazer um show baseado no inaudível disco Metal Machine Music. Os ingressos evaporaram em uma hora e eu acabei ficando sem.