domingo, 18 de agosto de 2013

Oito chazinhos depois...


Música errada e chá são duas coisas que amo profundamente. Hoje, pude conferir uma combinação dessas lindezas no concerto NMEchá#2, que foi também minha primeira experiência gustativo-musical.

O NME (o nome vem de Nova Música Eletroacústica) é um grupo de compositores jovens que há dois anos se dedica à nada fácil tarefa de criar, gravar, divulgar e apresentar para o público peças eletroacústicas. O projeto chá, que já está na segunda edição, consiste em oito composições, cada uma assinada por um artista e baseada em um chá. No concerto, a respectiva bebida é servida enquanto a peça é tocada.

Tudo começou com chá verde e Unwinding Tensions, de Ivan Chiarelli. A peça usa sons relacionados à preparação do chá (água sendo despejada, fogo, água fervendo) e retrata bem sensação de calma, relaxamento e conforto de tomar um chazinho quente em um dia frio.

A partir da segunda peça, a relação entre o chá e a música fica bem menos explícita. Prematuro, do Cadu Tenório, é uma repetição quase hipnótica de uma mesma frase e, se não tem a carga emocional negativa dos trabalhos do VICTIM!, também não é uma coisa leve e reconfortante. E o chá que deu origem à música é justamente... camomila, a infusão mais paz e amor do mundo.

Bom, não vou comentar cada um dos chás/músicas, que acho o esquema faixa-a-faixa um saco. Também porque, pra ser sincera, nenhuma das composições apresentadas mudou minha vida. O legal mesmo foi o evento como um todo. Foi passar a tarde fria de domingo em um lugar bacana (a Casa das Caldeiras), com sofás confortáveis para sentar, ouvir os compositores que estavam presentes falar sobre suas obras e se desdobrar na função mezzo artista de vanguarda mezzo copeiro, e ter a experiência de receber estímulos de cheiros, sabores e sons ao mesmo tempo.

Não sei se esse era um dos objetivos do pessoal do NME, mas a impressão que eu tive foi que o chá ajuda a tirar a fruição do domínio do cabeção e levar pras sensações, dando brecha, inclusive, para que o gosto puro e simples se manifeste, sem culpa. E, em matéria de gosto, o que mais me agradou foi a composição Mangarataia, de Caio Kenji, acompanhada de chá de gengibre. O autor contou que sempre tomava chá de gengibre quando estava mal de saúde e que a peça era inspirada nesses períodos de convalescença. Ao contrário daquela calma triste que relacionamos com doença, Mangarataia é uma composição vigorosa e barulhenta. Estive doente recentemente - um dos motivos pelo blog ter ficado abandonado por dois meses - e senti justamente o que ouvi na peça. Se, por fora, eu estava com cara borocochô, por dentro eu estava fervilhando de questionamentos e crises e vontades de mudar e de voltar à vida normal o mais rápido possível.

Também curti bastante as pancadarias de Lucas Rodrigues Ferreira (Uns Aforismos, com oolong) e J.-P. Caron (Noisecomposition II, com matchá).

Pra quem ficou curioso, no domingo que vem tem mais, no espaço cultural Cecília - só ficar ligado no Facebook dos caras para mais informações.

E como o NME é totalmente independente e se banca na raça, bora dar uma força pro projeto pelo Catarse.

Por fim, vale conferir os outros discos do NME disponíveis pra audição no bandcamp.


quarta-feira, 12 de junho de 2013

Ecos itamarianos

Itamar Assumpção faleceu há exatos dez anos. Que ele foi um dos músicos mais inventivos do Brasil e que sua influência se estende até hoje são fatos inegáveis. Como também não dá para negar que parte dos artistas/grupos que citam Itamar como referência não estão assim tão comprometidos com o novo. Mas vamos falar de coisa boa: em 2013, foram lançados dois discos que mostram que tem gente aprendendo direitinho a lição do Nego Dito - ou seja: absorvendo a influência e indo além.

 Eslavosamba - Cacá Machado
Canto falado, participação de nomes da vanguarda paulista (Arrigo, Ná Ozzetti, Wisnik), humor e arranjos que misturam o samba com uma certa dureza leste europeia:



 Passo Elétrico - Passo Torto
Sem dúvida, um dos grandes lançamentos de 2013. O segundo disco do projeto de Kiko Dinucci, Rômulo Fróes, Rodrigo Campos e Marcelo Cabral, também parte do samba para devidamente entortá-lo com guitarras distorcidas e efeitos. "A cidade cai", sobre a contínua destruição/reconstrução de São Paulo, é a típica anti-ode itamariana à cidade que é outra coisa:



Neste sábado, às 16h na TV Brasil, o programa Paratodos vai exibir uma matéria especial em homenagem ao Nego Dito feita por moi. Depois posto o link por estas bandas.


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quarta-feira, 29 de maio de 2013

Sagração da Primavera, 100 anos

Um século atrás, estreava no teatro parisiense Champs Elisées a obra de Igor Stravinski coreografada por Vaslav Nijinski, a plateia tinha um ataque de fúria e a música moderna nascia. Para comemorar a data, separei três montagens diferentes do balé:

Recriação do original de 1913:



Pela companhia de Maurice Béjart, que transformou o sacrifício em dança do acasalamento:



Meu favorito, pela companhia de Pina Bausch:




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terça-feira, 16 de abril de 2013

O som ao redor


Tão bom quanto assistir ao show de um artista ímpar é poder conhecer um tiquinho o modus operandi desse artista - e, no último fim de semana, tive a oportunidade de fazer as duas coisas graças à apresentação de Phil Minton (ao lado da incrível Audrey Chen) e à oficina Feral Choir que ele ministrou no CCSP. De quebra, ainda tive a honra (ou a falta de noção...) de botar minha voz de arara fanha para soar na sala Adoniran Barbosa, já que Minton convidou os participantes da oficina de sexta para darem uma palhinha no show do sábado.

Bom, quando entrevistei Minton e Han Bennink no finzinho de 2010, o que mais me impressionou foi ver como aqueles dois senhores quase septuagenários se comportavam como moleques descobrindo o mundo. Tudo despertava o interesse deles: uma mulher bonita passando, um maluco dando trocentas voltas correndo no Trianon, a feirinha do MASP, os sons. Principalmente os sons. Tanto que, no parque, Phil Minton já entabulou uma conversa com os passarinhos por meio de assobios.

A paixão pelos sons ficou ainda mais evidente na oficina na sexta-feira. De olhos fechados, ele comandava o coral e se divertia com os sons produzidos pelo gogó dos participantes. E quando digo se divertir, quero dizer que ele sorria, ria e tinha no rosto aquela expressão de quem diz "não gostaria de estar em nenhum outro lugar agora".


Além da simpatia e da generosidade, é preciso dizer que ele tem um ouvido do caralho. Conseguia saber o que cada um estava fazendo, e quando sacava que, no meio da cacofonia, havia duas ou três pessoas  fazendo algo que se encaixava, ia delicadamente mandando todos pararem de cantar e só esse pequeno grupo continuar - e era aí que os incautos participante finalmente se davam conta da pequena pepita sonora perdida no monte de grunhidos.

Minton também está sempre atento aos sons involuntários: o barulho de um cano de água, a sirene de um carro de polícia (que numa dessas coincidências bizarras soava exatamente como o barulho que estávamos produzindo com a voz no momento) e uma nota que estava soando pela construção. Essa nota, aliás, foi escolhida por Minton para ser o tom do drone que ficamos segurando enquanto ele cantou lindamente com melodia e letra - pena não ter feito isso no sábado, foi a parte da oficina que mais me emocionou....


E isso tudo me ajudou a compreender o tipo de experiência musical que ele oferece ao público dos shows. Apesar de não ser facilmente digerível, sua música não é hermética. Não é preciso conhecer profundamente a música contemporânea nem ler um tratado filosófico de 600 páginas para entender o que ele e Audrey Chen faziam no palco. Aliás, arrisco dizer que nem há o que entender: basta manter a mente e os ouvidos abertos e apreciar duas pessoas explorando suas vozes. Explorando os sons.

Talvez por isso eu nunca tenha presenciado um show de improvisação livre que começou com a plateia cheia e, raridade das raridades, terminou com a plateia cheia.


ps: agradeço ao Cauê Ueda por ter cedido as fotos lindonas que ilustram esse post.



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terça-feira, 9 de abril de 2013

MuCoMuFo 6: Audrey Chen


Nos shows que fará no Brasil, Phil Minton será acompanhado por Audrey Chen. A cantora e violoncelista já tocou com um monte de gente, incluindo meus queridos Mats Gustafsson e Matana Roberts, além do próprio Minton, com quem lançou o disco By The Stream em 2013:



Assim como o parceiro musical, Audrey é um cantora (ou uma não-cantora) comprometida em explorar ao máximo as possibilidades contidas na voz, sacando do gogó sussurros arranhados, urros, vibratos quase líricos e uma gama enorme de sonoridades que nem valem a pena tentar descrever com palavras.

Audrey é capaz de ir da delicadeza zen de uma Meredith Monk até a agressividade de uma Diamanda Galás - e isso sem entoar uma melodia ou pronunciar uma palavra compreensível e ainda tocando violoncelo e mexendo em umas traquitanas eletrônicas:


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segunda-feira, 8 de abril de 2013

Phil Minton no Brasil


Graças à Desmonta e ao Centro Cultural São Paulo, o fera da improvisação livre Phil Minton estará de volta ao Brasil a partir do dia 11 de abril. Além de shows em Pouso Alegre e São Paulo ao lado da cantora e violoncelista Audrey Chen, Minton vai ministrar dois Feral Choirs em SP.

O Feral Choir é uma oficina de exploração vocal para não cantores - claro que cantores também podem participar, mas a ideia é a coisa não ficar restrita aos entendidos. Nas palavras do próprio Minton: "Nos workshops encorajo os participantes a perceber que toda pessoa que consegue respirar é capaz de produzir sons que dão uma contribuição estética positiva para a humanidade, e muitas dessas contribuições vêm sem influências ou referências culturais".

O resultado da empreitada é algo parecido com isso aqui:



Itinerário completo de Sir Minton pelo Brasil:

11.04 (quinta-feira) – SHOW DUO
Pouso Alegre/MG @ Conservatório de Música de Pouso Alegre
R. Francisco Sales, 116 | 20hs
(Entrada Gratuita)

12.04 (sexta-feira) – FERAL CHOIR
São Paulo/SP @ CCSP
Rua Vergueiro 1000 | 19hs
(As vagas serão preenchidas de acordo com a ordem de chegada dos participantes)

13.04 (sábado) – SHOW DUO
São Paulo/SP @ CCSP
Rua Vergueiro 1000 | 21hs
(Entrada gratuita, retirada de ingressos: na bilheteria, duas horas antes do início do show)

14.04 (domingo) – Show: Phil Minton/Audrey Chen/Miguel Barella (SOKKYOTTO#12)
São Paulo/SP @ Otto Bistro
Rua Pedro Taques, 129 – Consolação – São Paulo/SP
19hs | Minimo sugerido, R$10

15.04 – Phil Minton (FERAL CHOIR “oficina”)
São Paulo/SP @ Instituto de Artes da Unesp
Rua Dr Bento Teobaldo Ferraz, 271 – Barra Funda – São Paulo/SP
18h30 | Entrada Gratuita

15.04 – Phil Minton/Audrey Chen/Thomas Rohrer/Panda Gianfratti/Luiz
São Paulo/SP @ B_Arco
Rua Dr. Virgílio de Carvalho Pinto, n°426 – Pinheiros – São Paulo/SP
21hs

Como recordar é viver, sugiro conferir a entrevista e o vídeo com Phil Minton e Han Bennink durante a passagem deles por São Paulo em dezembro de 2010 - trabalho que fiz para a +Soma com o fotógrafo Fernando Martins e o videomaker Fernando Stutz.

E durante essa semana, farei um mini-especial Phil Minton na página do Destruindo Pianos no Facebook - quem ainda não segue, taí um bom motivo.


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quarta-feira, 27 de março de 2013

Novidade do VICTIM!


Se você acha que a infância é a época mais linda da vida, que tudo é só alegria e inocência e desenhos animados fofos na TV, o VICTIM! é pra você - pra juntar suas convicções construídas durante anos de Show da Xuxa e mandá-las descarga abaixo.


Sexually Reactive Child foi provavelmente o disco mais bad vibe de 2012 (falei bastante sobre ele aqui), e agora em abril Cadu Tenório vai lançar o álbum Lacuna. A faixa-título já apareceu na internet, acompanhada de um clipe igualmente perturbador, com direito a cenas de vídeos familiares e fotos rabiscadas de crianças:

VICTIM! - Lacuna from VICTIM! on Vimeo.


Fazendo uso de um extenso trabalho de pesquisa sonora e construção de timbres para retratar o horror, e usando o horror como alimento da exploração sonora, o VICTIM! segue sendo um dos projetos mais interessantes do noise nacional atual.

Update 9 de abril: o disco já está disponível para download no site da Sinewave. E a +Soma fez uma entrevista e um faixa a faixa bem bacanas com o Cadu Tenório. Confira aqui.
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domingo, 3 de março de 2013

Vem tacar fogo no mundo



Mats Gustafsson, responsável por um dos melhores discos de 2012, The Cherry Thing, começou 2013 com uma outra deliciosa pedrada na cabeça. Exit! reúne o trio Fire! (que tocou no Brasil em 2011 no festival Jazz na Fábrica) e outros 28 músicos de free jazz, noise, rock experimental e avnt garde da Suécia. As letras são de Arnold de Boer, vocalista atual do The Ex. O disco me pegou desde a primeira audição, há mais ou menos um mês atrás, e desde então venho ensaiando escrever um texto sobre o que faz o álbum tão incrível - e, surpreendentemente, não foi tarefa fácil.

Embora Exit! tenha inegavelmente um ar de frescor, ao analisar friamente a música, não encontrei nada que já não tenha sido explorado antes, inclusive no The Cherry Thing (e ainda há algo totalmente novo a ser explorado na música? a dúvida paira no ar). O que parece ser o grande trufo do disco é levar técnicas e ideias à quase perfeição. Por exemplo, o uso de uma base repetitiva.

O baixista Johan Berthling é um herói, simples assim. Porque só com senso rítmico aguçado e ego sob controle é possível fazer o que ele faz. Na primeira faixa do disco (Exit! é composto por duas faixas, uma de pouco mais de 19 minutos e outra de 25) ele passa nada menos do que 10 MINUTOS executando em loop uma sequência de três notas, e depois mais uns oito minutos tocando uma sequência de oito notas. Enquanto o baixo se mantém firme e forte na base, a música passa por diferentes climas, mudanças de dinâmica, momentos de calmaria e de explosão sonora com vários instrumentos improvisando ao mesmo tempo. 

Até aí, nada de novo no front - quantos artistas já não usaram essa técnica antes? Mas o fato é que esse recurso faz com que a música de Exit! seja ao mesmo tempo experimental e cheia de groove, uma música elaborada que pode ser apreciada com o corpo e não só com o cabeção. Para isso, também colaboram o trabalho das cantoras Mariam Wallentin e Sofia Jernberg (que passeiam pela psicodelia à lá Jefferson Airplane, pela sensualidade à lá Neneh Cherry e pelos experimentos vocais à lá Diamanda Galás) e pelo uso de crescendos que pouco a pouco levam a música ao clímax. Novamente, Mats Gustafsson não inventou a roda - mas aprendeu direitinho a manejá-la para nosso prazer auditivo.



Finalmente, Exit! trabalha com diferentes gêneros musicais. Como Mats Gustafsson disse na matéria de capa da Wire de março: "... ver se você pode combinar, por exemplo, riffs dessa qualidade, que têm mais a ver com coisas de krautrock ou rock alternativo, e a liberdade do free jazz e do noise, e uma canção, letras - ver como tudo isso trabalha junto, ou então o atrito, a energia que dá à música". A fala do saxofonista logo me remeteu a uma das teorias que Simon Reynolds desenvolve em Retromania: de que boa parte da música feita hoje não é inspirada na vida e sim na coleção de discos do seu criador. É muito mais um trabalho de curadoria do que de invenção. 

No entanto, a abordagem de Mats Gustafsson é de outra natureza. Embora ele pague tributo a ídolos  como Peter Brötzmann e Don Cherry, ele não tem nenhuma preocupação com resgatar tradições, manter o jazz vivo ou qualquer coisa do gênero. Dá para perceber no som a empolgação do moleque de 18 anos que encontrou em Machine Gun a mesma energia das bandas punks que ouvia na sua cidade-natal no norte da Suécia. E assim Mats Gustafsson seguiu fazendo música sem nenhuma dívida com o passado nem com o futuro. O presente agradece. 

 


sábado, 26 de janeiro de 2013

Kevin Drumm, o esgotamento do drone e o tempo da arte



Kevin Drumm, prolífico como é de costume, já começou sua série de lançamentos de 2013 com o disco Tannenbaum. A primeira das oito faixas do álbum, Night Side, tem nada menos que UMA HORA, UM MINUTO E UM SEGUNDO de duração e é uma das coisas mais radicais feitas com drone que eu já ouvi: as mudanças de timbre, altura e dinâmica são tão sutis que a impressão é que, tirando um momento ou outro, nada acontece na música. Isso me levou a duas questões:

- o esgotamento do drone: a pedra foi cantada por Sávio de Queiroz em sua lista de fim de ano para o excelente blog Matéria e eu, com uma pontada de infelicidade, tendo a concordar. Por ser uma maneira de fazer música baseada na imobilidade, vai chegar um momento (e, ouvindo Night Side, parece que ele está bem próximo), que a coisa vai parar de vez. No lugar de uma música que desafia o ouvinte a encontrar um mundo rico de sons onde aparentemente só há uma repetição indefinida de umas poucas notas, teremos uma música que não tem nada a oferecer além da repetição indefinida de umas poucas notas. O desafio passará, então, a ser uma mera prova de resistência para o ouvinte. Um caminho mais inteligente parece ser o de Stephen O'Malley, que em seus diversos projetos como Sunn O))), KTL e Aethenor, usa o drone como estrutura da música, sobre o qual é possível colocar linhas de sopro, vocal, orquestração etc.

- o tempo da arte: para mim, a principal função da música enquanto arte é tirar o ouvinte da vida cotidiana e levá-lo a um mundo de pura contemplação, para uma atividade totalmente improdutiva que consegue escapar da lógica do consumo que perpassa todos os aspectos da vida atual. É preciso que o ouvinte entregue seu tempo e sua atenção para o artista, que lhe dará, em troca, a experiência. Até aí, tudo muito lindo. Acontece que o dia tem um número limitado de horas, os anos tem um número limitado de dias e a vida tem um número limitado de anos. Portanto, quanto de tempo e de atenção (levando em conta que, para ter a experiência, é preciso se focar totalmente na obra - não dá para estar em um concerto e acessando o facebook pelo celular ao mesmo tempo) um artista pode exigir do seu público? Qual o limite a partir do qual essa transação passa a ser injusta para uma das partes?

E então lembro que há mais sete faixas de Tannenbaum pedindo para serem ouvidas - e, dando play, sei o que vou perder, mas não sei o que vou ganhar.



segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Porra, Beck!


Acho Beck um geninho e amo quase tudo o que ele faz - até quando ele decide regravar o disco do Yanni na Acrópole (sim, você já viu um trecho desse show algum dia que estava zapeando e passou pela Rede Vida, acredite). Mas desta vez o cara me decepcionou. Acontece que Beck, cujo último álbum, o ótimo Modern Guilt, data de 2008, resolveu lançar um disco novo sem lançar um disco novo.

Explico: trata-se do projeto Song Reader, para o qual Beck compôs as canções de um disco, mas em vez de entrar em estúdio e gravá-las, resolveu disponibilizar as partituras na internet e convidar as pessoas com acesso à banda larga a transformar as notações em músicas. Parece uma ideia bacana - aquele lance todo de interação e tal - mas analisemos melhor o resultado ouvindo, por exemplo, essa versão de Sorry (também dá pra ouvir esta, esta ou esta):


Agora eu pergunto: qual foi sua reação ao escutar a faixa?
A) nossa, que música bonita - ainda bem que Beck resolveu dá-la de presente para os fãs interpretarem a seu modo
B) nossa, que música bonita - mas queria ouvir com o arranjo do Beck e a voz do Beck

E agora eu pergunto: não tá na hora desse moço parar de inventar e gravar logo um disco novo?



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sábado, 19 de janeiro de 2013

Off Topic: Mali e o mundo sem música

Quem abre de vez em quando o caderno internacional do jornal deve ter se deparado com notícias nada boas sobre a situação no Mali. Um grupo de fundamentalistas islâmicos ligado à Al Qaeda tomou o poder no norte do país e começou seu itinerário típico: confisco das liberdades civis, aplicação da sharia, opressão às mulheres etc e tal. Mas desta vez o roteiro infelizmente já conhecido do fanatismo religioso na política ganhou um adicional: a música foi proibida - como também aconteceu no Afeganistão sob o talebã.

Em comunicado oficial, um dos líderes dos insurgentes disse uma das coisas mais perturbadoras que eu já ouvi (no caso, li): “A música contraria o Islã. Em vez de cantar por que é que não leem o Corão? Não estamos unicamente contra os músicos do Mali; estamos em guerra contra os músicos de todo o mundo.”

Não consigo e nem quero entender o que se passa pela mente alucinada de uma pessoa (aliás, de um grupo grande e organizado de pessoas) para sequer aventar a possibilidade de um mundo sem música. Felizmente, já há vozes no Mali se levantando contra esses aloprados - e usando a música para mobilizar a população a não apoiar essa guerra. É o Voices United for Mali, grupo formado por mais de 40 músicos do país, que lançou da capital Bamako esse belo vídeo:

 



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