segunda-feira, 7 de julho de 2008

No New York



Cara, foi um parto baixar esse disco. Até aprendi a fazer download pelo torrent pra conseguir – e no fim vi que é bem fácil usar esse treco... Mas enfim, falemos do que realmente importa.

No fim dos anos 70, logo após o estouro do punk, algumas bandas resolveram levar o espírito destruidor (no bom sentido) do movimento um passo além: apesar das letras contestadoras, dos berros e das cuspidas na cara de fãs, em termos estritamente musicais o punk não trazia grandes inovações. Pelo contrário: o que a maioria dos grupos propôs foi uma volta ao rock básico, então soterrado pelas toneladas de virtuosismo do progressivo. Tudo continuava em 4 por 4, tonal e com o velho esquema tônica- subdominante-tônica. Mas aí apareceram na cidade de Nova York bandas que, em vez de tocar três acordes na guitarra, preferiam socar o instrumento. Em oposição ao pop da new wave (também um desdobramento do punk), o novo estilo musical foi batizado de no wave.

Os shows das bandas de no wave duravam dez, quinze minutos, e eram uma explosão de ruídos. Foi nessas apresentações que um cara chamado Thurston conheceu um outro chamado Lee e uma garota chamada Kim. Os três resolveram montar uma banda e o resto da história todo mundo já sabe. Outra figura a se interessar pelo novo som foi o já conhecido Brian Eno – sim, antes de se tornar produtor do (glup) Coldplay, ele era um cara legal que tocou no Roxy Music, lançou discos fodaços como Here Come the Warm Jets e Taking Tiger Mountain, e percebeu a importância do que estava acontecendo em Nova York.

Em 1978, Eno resolveu organizar uma coletânea com os principais nomes da cena. Os escolhidos foram James Chance & The Contortions, Teenage Jesus and the Jerks, Mars e DNA. Cada um deles participou com quatro faixas, e assim nasceu No New York, o disco que foi um parto baixar.



James Chance & The Contortions (creditada apenas como Contortions) é a primeira banda, e abre a compilação com “Dish It Out”. A música começa com o baixo fazendo uma linha simplíssima enquanto um saxofone cospe desordenadamente zilhões de notas, quase nenhuma delas afinada e muitas delas em frequências agudíssimas. O uso do sax remete ao free jazz, estilo que (e)levou o jazz ao caos sonoro e que também foi fonte de inspiração pro povo da no wave. Depois de mais de um minuto de sopros insanos, entra um órgão e James Chance (que também é quem toca o sax) começa a cantar, quer dizer, a berrar. Apesar do clima aparentemente caótico, a música segue a forma tradicional estrofes – refrão.

Na faixa seguinte, “Flip Your Face”, o refrão é abolido e as guitarras ganham mais projeção. Como em “Dish it Out”, o baixo executa uma linha bem definida e constante, com notas afinadas, e sobre essa base vem a barulheira, desta vez extraída das seis cordas (esse esquema, aliás, lembra bastante o do trio Thurston-Lee-Kim, não? Referências são tudo nessa vida). Em “Jaded”, é a vez do órgão ganhar mais espaço, martelando acordes dissonantes que, somados ao andamento lento e às incursões ruidosas das guitarras e do sax, formam o fundo instrumental para a letra sobre amor obsessivo. “I Can´t Stand Myself”, última faixa do The Contortions é um cover, ou melhor, “cover” de James Brown e segue o mesmo modelão “baixo segurando a onda (e nesse caso, fazendo um groove) enquanto a casa cai”.



O próximo da lista é o Teenage Jesus and the Jerks, da lendária vocalista/guitarrista Lydia Lunch. Ela foi uma figura importantíssima da no wave a até teve uns rolos amorosos com o James Chance, mas sua banda estava muito atrás do Contortions. Além de menos experimental, o Teenage Jesus é tosco – coisa que o baixo da primeira faixa, “Burning Rubber”, já deixa bem evidente. As letras e a interpretação angustiada de Lydia Lunch são o trunfo da banda. Quando, em “The Closet”, ela expressa o horror de viver na classe média americana com um “I’m treated like Sharon Tate”, o arrepio na espinha é inevitável.


A terceira banda, Mars, chega mandando “Helen Forsdale”, música que segue o estilo Contortions de baixo normal e guitarra pirada – e que pirações legais... Letras quase ininteligíveis são uma característica da no wave, mas nessa música isso é levado ao extremo. Parece que o cara está cantando em alguma língua morta de uma tribo perdida da Groenlândia, mas, por incrível que pareça, “Helen Forsdale” é em inglês e até tem letra dela no encarte do disco (demorou pra baixar, mas veio completo!). Tentei umas três vezes acompanhar e juro que não dá para encaixar nenhuma palavra. Sério, NENHUMA. Punk à décima potência, baby.


Em “Hairwaves”, o vocal continua um emaranhado de grunhidos, mas é a música como um todo o que mais chama a atenção: não tem ritmo, melodia, harmonia ou tonalidade – pelo menos não identificáveis para os ouvidos de um ser humano normal. Toda cheia de buracos, quebras e silêncios, “Hairwaves” parece flutuar no nada. Linda. “Tunnel” também é pura entropia, só que dessa vez, furiosa. Já “Puerto Rican Ghost”, que dura apenas um minuto, é uma música de urgência (“mommy close the door/ mommy close the door/ puerto rican ghost/ puerto rican ghost”) e talvez também uma crítica ao medo de “chicanos”, tão comum na terra do tio Sam (ou talvez eu apenas esteja viajando na maionese).


O último nome da compilação é o D.N.A., banda que tinha Arto Lindsay na guitarra e que não possuía baixo. A primeira música (“Egomaniac’s Kiss”) e a última (“Size”) não fazem muito sentido dentro da coletânea por trazerem pouco radicalismo sonoro. São, digamos assim, punk rock convencional (no caso de “Egomaniac’s Kiss”, com uns toques de blues). Na instrumental “Lionel”, a coisa começa a melhorar, ou seja, a ficar mais barulhenta. “Not Moving”, a terceira faixa, é o ápice, com uma guitarra enlouquecida que, mais ou menos no meio da música, começa a emitir uns sons que parecem passarinhos psicóticos. E quando o vocalista repete “Not Moving, not moving”, ele fica em apenas uma nota, dando a sensação de que a própria música também não sai do lugar. Chico Buarque pós-punk.

E assim acaba No New York, o disco que foi um parto baixar, mas que não será mais, pois eu, legal que sou, comprimi o bichinho em .rar e botei no RapidShare:
http://rapidshare.com/files/127969866/VA_-_No_New_York__ogg_.rar.html

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