sábado, 7 de fevereiro de 2009

Clássicos do dia 7: Sonic Youth - Confusion is sex



A confusão vem vindo...

Como dois guitarristas revolucionaram o modo de tocar o instrumento – e ninguém deu a menor bola

Ao contrário do que muitos imaginam, Confusion is Sex, lançado em 1983, não é o primeiro álbum do Sonic Youth. No ano anterior, o grupo havia lançado um disco auto-intitulado contendo cinco músicas, e este é considerado o álbum inaugural pela própria banda (e é um disco interessante, mas meio esquizofrênico. Rolam até uns batuques em algumas faixas). De qualquer forma, Confusion is Sex é o primeiro long-play e também o álbum no qual eles mostram a que vieram – quer dizer, as guitarras de Thurston Moore e Lee Ranaldo mostram a que vieram. Isso porque:

1) em 1983, o Sonic vivia num quiproquó de bateristas, e nenhum dos que entraram e saíram eram lá muito talentosos. A situação só melhoraria com a entrada do homem-metrônomo Steve Shelley em 85;

2) a banda ainda não tinha estabelecido o esquema “Thurston Moore cantando músicas que precisam de um vocal suave, e Kim Gordon cuidando daquelas que precisam ser interpretadas com raiva”;

3) outra sacada que só foi rolar anos depois é a de usar barulhos como base para melodias assobiáveis. Essa fusão entre noise e pop possibilitou que faixas de discos como Dirty e Goo possam tanto ser apreciadas pelo seu caráter de vanguarda como curtidas descontraidamente em pistas de clubinhos indie.

Portanto, o que o disco trouxe de novo ao rock foi a maneira de tocar, ou melhor, de utilizar guitarra. Depois que Jimmy Hendrix virou o mundo das seis cordas de ponta cabeça, surgiu uma leva de guitarristas incríveis que tornaram o fim dos anos 60 e toda a década de 70 a época de ouro do instrumento: Jimmy Page, Ritchie Blackmore, David Gilmour, Brian May, Eric Clapton, Jeff Beck, Carlos Santana... esses caras aperfeiçoaram a técnica, instituíram o solo nas canções de rock (eu também acho um saco, mas na época fazia sentido – e eles criavam uns puta solos...) e são a base para qualquer guitarrista de rock que queira tocar bem. Só que, apesar de eventuais maluqices psicodélicas, eles continuavam a tratar a guitarra basicamente como um instrumento melódico/harmônico – e, afinal de contas, a guitarra foi criada para ser um instrumento melódico/harmônico.

E aí, nos anos 80, Thurston Moore e Lee Ranaldo vieram causar a confusão. Não foram os primeiros, claro. Lááá em 1967, Lou Reed e Sterlin Morrison já faziam estrago com seis cordas no Velvet Underground, e no fim dos anos 70 veio a no wave e o caos geral. Mas ninguém explorou as possibilidades barulhísticas do instrumento como Thurston e Lee, que, na procura de sonoridades, criaram afinações bizarras, socaram cordas com baquetas, fizeram experiências com a microfonação provocada pelos amplificadores, entre outras estrepolias. Já ouvi e li por aí que a opção pelo barulho em vez de notas surgiu porque os instrumentos de que dispunham eram tão ruins que seria impossível tocá-los do modo convencional, ou que usar a guitarra como instrumento de percussão foi a solução encontrada para os shows que tiveram que fazer sem baterista. Du-vi-do. Essas histórias podem até ser engraçadinhas, mas, ei!, Thurston e Lee eram fãs de no wave e discípulos de Glenn Branca. Eles sabiam o que queriam.

Seria um trabalho insano e um tanto inútil tentar traduzir em palavras as sonoridades ouvidas em Confusion is Sex, e seria impossível tentar desvendar como eles chegaram a essas sonoridades. Para mim, a última faixa, chamada “Lee is free” é a mais emblemática. Dá até para enxergar Lee e Thurston em uma sala cheia de guitarras, explorando livremente os instrumentos. E é aí que está a chave: explorar, experimentar, descobrir. Confusion is Sex representa um marco, uma revolução na maneira de tocar guitarra. Mas o incrível é que parece que ninguém se tocou.

Explicando melhor: ao longo dos quase trinta anos de carreira, o Sonic Youth se tornou um dos nomes mais influentes do rock (dá para ouvir ecos de SY em 99% das bandas alternativas/experimentais), arrebanhou milhares (milhões?) de fãs pelo mundo e se tornou um ítem obrigatório na lista de preferências de quem quer parecer descolado, mas até hoje, Thurston Moore e Lee Ranaldo não são encarados como INSTRUMENTISTAS revolucionários. Talvez um dia, quando o mundo da guitarra deixar de ser dominado por atrações de circo como Malmsteen e Satriani, eles sejam devidamente reconhecidos. Até lá, muito “músico” por aí vai continuar dizendo “Sonic Youth é uma merda! Os caras nem sabem afinar a guitarra...”

Para baixar o disco, clique aqui (essa é a versão lançada em CD em 1995, que também traz as faixas do EP Kill Yr Idols)

Nenhum comentário: